Como se livrar de um vendedor - Crônica


Quando as empresas contratam os serviços de um vendedor costumam dar-lhe, antes de deixá-lo trabalhar, um treinamento no qual ele aprenderá formas de responder a todos os possíveis argumentos de seus futuros fregueses e outros pequenos macetes que serão usados para persuadir compradores desavisados. Esse é o maior problema para quem quiser livrar-se de um vendedor, pois nós consumidores não recebemos orientação alguma para dizermos um não convincente. Somos sempre pegos de surpresa.


Há algum tempo venho pensando em formas de livrar-me das compras indesejadas. Para isso tenho observado alguns dos métodos que esses gênios do marketing usam para nos convencer a adquirir seus produtos e, a partir daí, desenvolvi o meu método de defesa, que tentarei, solidariamente, transmiti-lo aos leitores interessados.

Começarei mostrando o caso de um senhor, já de certa idade, que, atendendo ao toque da campainha, deparou-se com um homem que segurava uma caixa cheia de livros e que, ao vê-lo, disse: “esses são seus.” E em seguida começou a falar como uma gralha em surto, não dando tempo, ao desavisado ancião, de lembrar se havia feito algum pedido. O vendedor foi logo sugerindo que a vítima preenchesse o cheque para ficar livre e usufruir de sua nova aquisição. Não é preciso dizer que, de tão aturdido, o pobre homem preencheu e assinou o cheque para, só depois de o vendedor ter ido embora, dar-se conta de que não havia feito encomenda alguma. Bem, se isso acontecer com você, não titubeie. Quando ele disser que os livros são seus não deixe que continue falando, pegue a caixa de suas mãos, agradeça o presente, feche a porta na cara dele e não abra mais, nem sob ordem judicial. Certamente, desse você estará livre.

E quanto àquele que chega a sua casa com um aparelho eletrônico qualquer dizendo que na nota consta o seu endereço? Obviamente você dirá que não comprou nada, deve ser algum engano. Ele, então, insiste dizendo que não pode ser, pois o número do apartamento é aquele mesmo e, enquanto isso vai tirando a mercadoria da caixa e demonstrando, para que você, fascinado, acabe ficando com o produto. Nesse caso, diga a ele que se quiser deixar o aparelho de graça você ficará muito contente. Como por magia ele, na mesma hora, perceberá que o número na nota fiscal não é o do seu apartamento e sim o da vizinha do andar de cima.
Não podemos esquecer, também, daqueles “pesquisadores culturais” que nos abordam na rua querendo saber nosso endereço, telefone e se achamos necessário conhecimento de língua inglesa. Responda que sim e, no outro dia, ligarão para sua casa ou mandarão mil correspondências para fisgá-lo. Quer outra opção? Diga a ele que você abomina esse idioma, que se pudesse, bombardearia todos o países que falam a língua inglesa e, assim que você virar as costas, ele rasgará a ficha com seus dados.

Não podemos nos esquecer daquela vizinha que vende lingerie. Você diz que não tem dinheiro, ela responde que pode ser para o mês seguinte. Você argumenta que também não terá em trinta dias, ela sugere que você lhe dê a quantia quando puder. Você contra-argumenta que não sabe quando poderá e ela, então, garante que não se importa em esperar. Você não tem saída. Compre e pague na próxima encarnação. Ela, com certeza, não lhe importunará outra vez, ao menos não nesta vida.

E, finalmente, ao deparar-se com o vendedor que deseja saber porque você não quer comprar, não tente responder, isso é armadilha. Esse tipo sabe todas as suas possíveis respostas e terá sempre um argumento na ponta da língua, até que você, exausto, se dê por vencido. Ao tentar enfrentá-lo você cavará a sua própria sepultura. A única alternativa é manter no rosto uma expressão de maus amigos e dar a ele uma resposta impossível de ser argumentada: diga simplesmente que não porque não.


Texto originalmente escrito no Scribe.

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